03/11/2008

PORQUE, IRA?


A “IRA” é uma confraria constituída por um “Grupo de reações emocionais desagradáveis, caracterizadas pela atitude de ataque ou defesa.” (DORIN, 1975, p. 162).

A Ira é uma das causas, senão a causa principal, dos desentendimentos que tem arrastado o mundo a tantas catástrofes, aterrorizando e proporcionando para a humanidade um perpétuo drama. Revelar o caráter verdadeiramente monstruoso que tal valor emocional assume sobre as pessoas ou objetos, ao agirem sob o desencadeamento da Ira denominado Yang.

Conhecê-la é “dominá-la”, com o intento de proporcionar o “equilíbrio”. Entretanto seu contraposto, o Medo é a emoção que segundo a Acupuntura, narcotiza, o qual é identificado como uma  Energia Yin.

A ânsia de domínio, de afirmação e de expansão do Ser, é um dos principais ingredientes da Ira, o qual, seus precursores são a Reflexão e a Ansiedade, que também antecedem, e são componentes do Medo, e, pode reprimir o estado de Ira.

A continuidade dos níveis de ação da Ira é qualificada como Raiva, condição em que já se apoderou por completo do individuo, em relação à direção e a conduta individual.

“Definimos raiva como uma emoção caracterizada por um alto nível de atividade do sistema nervoso simpático e por fortes sentimentos de desprazer os quais são desencadeados por um mal real ou imaginário – qualquer ato que vise a ferir pessoas ou propriedade. Descreve a maioria (mas não todos) dos casos de agressão” (DAVIDOFF, 2001, p. 451). 

As emoções aparecem logo depois do nascimento em associação íntima com os motivos. Reações semelhantes ao prazer, surgem quando as necessidades são satisfeitas. Os bebês se assustam, o que é um primitivo sinal de Medo. Durante o segundo semestre de vida surge a Ira. A partir dessa reação colérica inicial, da zona de movimentos, a extensão e a variedade dessas reações ampliam-se. A repressão de sensações é produzida por tensões musculares crônicas que restringem e limitam a mobilidade do corpo, e, por conseguinte, as sensações. Na ausência de movimentos, deixa imperceptível o sentir.

 Em Prazer: uma abordagem criativa da vida, Alexander Lowen lembra que, “o organismo humano dispõe de dois sistemas nervosos para integrar suas reações”. Um sistema cerebrospinal coordena a ação dos músculos voluntários e a energia dos nervos proprioceptivos e exteroceptivos. Regula também a tonicidade muscular e mantém a postura. Com graus diferentes para cada pessoa, os movimentos regulados por ele encontram-se sob controle consciente. Por exemplo, algumas pessoas podem voluntariamente mexer suas orelhas; outras conseguem contrair os bíceps. Os músculos sob o controle desse sistema são os estriados ou esqueléticos.

O outro é o sistema nervoso vegetativo ou autônomo, que regula alguns processos corporais básicos como a respiração, circulação, pulsação cardíaca, digestão, excreção, atividade glandular e reações das pupilas. Os músculos sob sua ação são chamados de músculos lisos porque não têm a característica estriada dos músculos esqueléticos que são maiores. Sua ação não está sob controle voluntário, daí a expressão “sistema autônomo”. Possui duas sub-divisões, conhecidas como sistema simpático e parassimpático, que agem antagonicamente. Os nervos simpáticos aceleram os batimentos cardíacos, enquanto que os parassimpáticos desaceleram-nos. (...). O sistema simpático, com a enervação das glândulas ad-renais, mobiliza o corpo para enfrentar as emergências criadas pela dor ou pela ameaça de perigo. Prepara o organismo para lutar ou fugir; nesse processo os sentidos são alertados, as pupilas dilatam, o músculo do coração é estimulado, a pressão sangüínea aumenta e o consumo de oxigênio se eleva. Os dois sistemas produzem efeitos opostos sobre a direção do fluxo sanguíneo.

A ação parassimpática dilata as arteríolas periféricas, aumentando o fluxo sangüíneo em direção à superfície tornando-a mais quente. O coração desacelera-se entrando num ritmo relaxado e cômodo. A ação simpática contrai as arteríolas superficiais, conduzindo o sangue para o interior do corpo provendo os órgãos vitais e a musculatura de mais oxigenação. Dessa forma, a ação parassimpática promove a expansão do organismo, levando-o em direção ao meio ambiente, isto é, promove uma reação agradável. A ação simpática produz contração e recolhimento, ou seja, uma reação à “dor”.

Toda situação dolorosa é uma emergência que faz com que a pessoa reaja através do sistema simpático ad-renal com um aumento do seu estado de tensão e de sua consciência do meio ambiente. Essa tensão resulta do estado de hipertonicidade nos músculos que se preparam para agir. Diferente da tensão muscular crônica descrita nos itens anteriores, que é inconsciente (por estar na heteroconsciência) e representa a persistência do estado de alerta oriundo de uma situação de emergência. O aumento da consciência envolve uma participação ativa da vontade. Numa emergência o indivíduo não age espontaneamente; toda ação é um movimento calculado e destinado a remover o perigo.

A vontade é um mecanismo de emergência. É ativado sempre que um esforço acima do normal é exigido para enfrentar uma crise. Por exemplo, é preciso vontade para atacar uma posição inimiga na guerra, já que a reação natural seria escapar se fosse possível. Da mesma maneira, requer-se a ação da vontade para persistir numa atividade dolorosa, já que a tendência natural é abandoná-la. A vontade exerce a função de sobrevivência frente ao que parece arrebatadoramente estranho. Quando a vontade é ativada, a musculatura voluntária do corpo é mobilizada, assim como os cidadãos de uma nação são mobilizados em época de guerra. (...). Os movimentos involuntários rítmicos e harmônicos que traduzem prazer devem dar lugar a movimentos controlados que expressam determinação. (...).

A vontade é antitética ao prazer. Sua atuação implica a situação dolorosa na qual alguém possa se encontrar e que requer a mobilização de todos os recursos de seu organismo. Quando a vontade é empregada mesmo para alcançar um objetivo menor, o corpo reage como se estivesse num estado de emergência; o sistema simpático ad-renal é estimulado para fornecer a energia exata ao esforço. Se o objetivo é imperativo, a sensação de emergência aumenta ao nível do corpo, mais adrenalina é segregada, a tensão muscular cresce e mais sangue é escoado da superfície do corpo. O objetivo pode ser físico, como levantar um peso, ou psicológico, como escrever um artigo dentro de certo prazo, mas cria um estado de tensão que se situa ao lado da dor no espectro.


 É evidente que o Amor possui uma identidade com a enervação parassimpática. No estado pleno de Amor, o corpo se expande, os tecidos superficiais são carregados de sangue e fluidos e as pupilas dos olhos se contraem para conseguir mais foco. 

Desde o surgimento das primeiras emoções, segundo Mira y Lopez (2003), tudo quanto moleste, doa ou perturbe o bem-estar fisiológico e psicológico do ser humano, desencadeará uma forma leve de Ira, que consiste em um suave sentimento de Exaltação ou Facilidade de Ação, o qual prepara a pessoa para conseguir os objetivos imediatos. É o primeiro estágio que precede a conduta agressiva controlável ou não, denominada pela Acupuntura como uma Energia Yang.

 

A segunda fase surge a partir dos primeiros obstáculos que se acham no caminho da ação, é distinguida por um Protesto Interior, que marca, por sua vez, o impacto, no “Eu”, gerando resistências conflitivas, e o principio de sua reafirmação dominante (condição onde se sente ofendido).

 

A terceira fase é demarcada por uma linha tênue de Rebelião Pessoal que se constitui pelo primeiro passo para a Conduta Ofensiva e gerador da ansiedade, os quais são os principais componentes da Ira e do Medo. Nesta fase a pessoa não percebe que é um ofensor e sim que foi ofendido.

Quando a Ira atinge este nível de intensidade, passa a produzir manifestações congestionantes típicas, como: impressão de calor, vasodilatação, “emburrecimento facial”, taquicardia e sudorese, potencializando assim, a energia Yang, que corresponde ao órgão psicossomático: Fígado, também denominado Madeira, que representa o nascimento do Yang da Ira, e possui como característica iniciar a ação, e proporcionar movimentos, estão relacionados aos músculos e tendões que revestem o arcabouço ósseo e servem para a mobilidade dos mesmos. Os órgãos dos sentidos relacionados são os olhos e a visão. O fato de o elemento Madeira estar relacionado ao início do movimento, tem relação com o Fígado, pois é ele o órgão que metaboliza as substâncias absorvidas. Para a Acupuntura a absorção é tanto nutricional quanto emocional. E é representado pela Acupuntura como o nascimento, a fonte que se espalhará por toda parte. (BASTOS, 1993).


No quarto grau de intensidade a Ira Mostra-se Desenfreada: inicia-se a ofensiva, com a perda do controle das palavras e golpes diretos ou indiretos, incluindo gestos violentos.

 

No quinto nível de ação, a Ira é Qualificada como Raiva e já se apoderou por completo da direção e da conduta individual. A intensidade do Medo é correspondente ao Pânico, que é o oposto da Raiva. Do mesmo modo, ocorrem sob os efeitos do Pânico, o individuo “não sabe o que faz”, pois chegou ao extremo da energia Yin, Assim também, sob os efeitos da raiva, ele torna-se um mero espectador de seus próprios atos, que são impulsionados por forças surgidas inopinadamente de seu interior, que podem o levar até o assassinato, conduzindo-o a um Estado Descontrolado de Fúria, que é a ascensão máxima do estado Yang. Durante o qual o indivíduo não só perde o controle de seus atos, mas inclusive a consciência ou percepção dos mesmos: torna-se apenas um autômato, uma espécie de projétil humano, capaz de qualquer ação causada por seu estado de furor e ódio, atacando não só os possíveis objetos determinantes de sua Ira, como a objetos neutros, e a si. Fica desprovido de Medo, perdendo inclusive o “amor próprio”. Um exemplo disto é, quando um indivíduo em estado de furor investe contra um grupo de pessoas, atirando com arma de fogo, em todos, causando um genocídio, e depois comete suicídio.

Mira y Lopez (2003), admite como atenuantes do nível de ódio e furor, a Ira, estágio onde o sujeito ainda tem, em termos, consciência de suas emoções e atos, podendo evoluir para o Medo, que é o que promove a contenção.

É somente quando surge um obstáculo, quando algo atinge o “Eu” e, de algum modo, o limita ou menospreza, isto é ao ver-se entorpecido, limitado ou fracassado em seu propósito vigente, acende-se a “crispa da cólera”. Mira y Lopez (2003), cita vários exemplos, um deles é quando estamos dormindo e ouvimos o zumbido de um mosquito, alertamo-nos e aguardamos em tensão.

Esperando que ele pouse em qualquer lugar de nossa pele para esmagá-lo, antecipamos o prazer de aniquilar esse que é considerado por nós um inimigo do sono. Ele pousa, e aplicamos em nós mesmos um forte tabefe. A esta altura já estamos zangados e começamos a encolerizar-nos.


As disposições emocionais que levam os membros de um grupo a punir o mau comportamento que prejudiquem outros, que os prive de propriedades ou interfira no seu comportamento, gera uma elevada inclinação para o contra-ataque onde a força fundamental de um controlador depende da força daquele que controla.

“As emoções tendem a agrupar-se em pares – Medo e Ira, Amor e Ódio – de acordo com a direção do comportamento que é reforçado. Podemos modificar o comportamento de um Homem deixando-o furioso. Seu comportamento não é apenas o de fazer alguma outra coisa; em certo sentido está fazendo exatamente o oposto. (...) reduzindo o padrão comportamento do medo enfurecendo-se ou não aceitando o desafio, ou evitando os prejuízos do ódio amando nossos inimigos” (SKINNER, 1994, p. 232).

Segundo Skinner (1994), a Ira procede do Medo, mas pode gerar o Amor, nasce sempre que o pavor assalta, sem aniquilar, e volta-se contra ele, atacando-o em sua recôndita guarita. Porém o alívio que proporciona é efêmero e perigoso, podendo converter os indivíduos em destruidores, cruéis, assassinos ou ferozes bestas humanas.

A Ira pode alcançar a onipotência do Ser, através de seu domínio imperioso, em seu trunfo sobre tudo o que possam opor-se à satisfação de seus desejos, necessidades, impaciência ou tendência. Ela também pode transmutar-se em curiosidade e diluir-se em trabalho explorador, pode se sublimar em gestos de conquistas, de simples afirmação do poder individual em um terreno que não ocasione sofrimento alheio: tal é o caso dos especialistas em recordes extravagantes.

Esta emoção também pode ser identificada no mau humor, que possui evidências e sinais de tendência à Ira fácil. Quase sempre um mal-humorado é um pessimista e, no fundo, um medroso que não o quer confessar, compete aos demais não o provocar ou, como se diz no senso comum, “não lhe pise nos calos”.

A curiosidade abre as portas que vão consumir as cargas da Ira forçosamente em algo proveitoso. Esta prende o individuo no fator desencadeante. Quer dizer, o “sujeito” começa a estar efetivamente “preso”, pois antes procurava libertar-se do objeto e agora se prende a ele.

Há uma diferença essencial, entre ansiedade colérica e inquietação exploradora. Ambas colocam o individuo “sujeito” ao objeto, na primeira o intento é de destruí-lo, enquanto na segunda é de incorporá-lo, ou melhor, assimilá-lo, de forma que passe a tornar-se parte substancial dos bens que tragam proveito.

Quando “algo” é útil, deseja-se conservá-lo, e não destruí-lo. Neste trânsito, de uma atitude aniquiladora a uma atitude exploradora, traça-se à rota pela qual poderá ser domesticado a Ira, denominada Yang.

“A palavra “agressivo” é utilizada psicologicamente em oposição a passivo. Agressivo significa mover-se em direção a uma pessoa ou a um objeto, enquanto que “passivo” denota a inibição desse movimento. A pessoa pode ser agressivamente hostil ou agressivamente afetuosa, assim como passiva em suas manifestações de hostilidade ou de afeição. É óbvio que a palavra “ativo” não pode ser utilizada neste contexto como antônimo de passivo, pois não encerra a conotação de direção ou objetivo. O jogador de tênis joga para ganhar; o jogador ativo não precisa necessariamente ter esse objetivo” (LOWEN, 1984, p. 159).



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